• Os Trabalhadores da CTMR

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Entre os dias 20 e 26 de setembro de 2021 se realiza a 15ª Primavera dos Museus. O evento, promovido nacionalmente pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), tem como tema “Museus: Perdas e Recomeços”, mote que propõe uma reflexão sobre a função dos museus neste momento de pandemia, as perdas que tiveram como instituições culturais e os recomeços que estão enfrentando.  

A Rede de Museus da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) participa desta edição da Primavera com a realização de palestras on-line e ações em suas redes sociais.

Com a exposição  virtual “ Os trabalhadores da CTMR”, o Museu das Telecomunicações da  UFPel traz algumas características do trabalho cotidiano, da modernização da telefonia, das instalações e da manutenção, encontradas nos depoimentos do projeto Museu de Vozes (2003 – 2005) e nas fotografias de seu acervo.

A – Gostaria que o Sr. contasse para nós como surgiu essa ideia do Museu do Telefone.

G – Quando eu entrei na área de material, observei que a CTMR estava tendo uma certa transformação, aquelas mudanças de rede física para automática e tal. Então eu observei que aquele determinado tipo de material estava ficando obsoleto. Durante esse período todo eu fui guardando aqueles materiais dentro de uma caixa e, com o passar do tempo, quando se via, não existia mais aquele material, mas eu tinha uma, duas, às vezes três peças de cada uma. Fui restaurando uma a uma e fui montando um mini museu dentro do almoxarifado. Quando já tínhamos uma certa quantidade de material, fomos até o diretor e sugerimos a ele que fosse construído o museu. Nós tínhamos uma área, um espaço físico desativado.

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Depoimento de Geraldo Lamas (G) em 2003.
Trabalhou na CTMR de 1972 a 1997.
Entrevistador:  André Luís Borges Lopes (A).
Fotografias de peças do acervo do Museu das Telecomunicações.

A – O setor de rua, do pessoal que trabalhava na rua?

G – Aí já entrava em área técnica. A área técnica era dividida em projetos, era a parte de instalação e a parte de cabista. Cabista é o seguinte: ele fazia a instalação do cabo telefônico da central até o poste. Aí entrava depois o instalador, que ia do poste até dentro da residência para instalar o telefone.

A – As primeiras redes que saíam eram subterrâneas ou aéreas?

G – As primeiras redes eram aéreas, toda rede era feita aérea. A saída central era subterrânea, mas logo após partia para aérea.

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Depoimento de Geraldo Lamas (G) em 2003.
Trabalhou na CTMR de 1972 a 1997.
Entrevistador:  André Luís Borges Lopes (A).
Fotografia sem data.

A – E tinha muita brincadeira?

G – A tinha brincadeira, no serviço coisa assim, a gente trabalha de dupla né, pegava, marcava seis metros, o capataz que estava observando media seis metros, e aquele seis metros a gente tinha que fazer durante o dia. A profundidade de um metro, um cavava e o outro tirava a terra, depois trocava, o lugar bom era fácil de cavar seis metros durante o dia.

A – Lugar ruim?

G – A não, lugar ruim não dava. Na Zona do Areal que era greda, aí não conseguia né? É muito duro, muita greda, e o chão muito duro, era difícil, pra cavar, tinha que cavar. Tinha que cavar com picareta, depois com a pá, pra poder tirar a terra.

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Depoimento de Gilmar Rocha de Leon (G) em 2003.
O Sr. Gilmar entrou para a CTMR em 1974 e começou a trabalhar no setor encarregado das valetas.
Entrevistador: André Luís Borges Lopes (A).
Fotografia sem data.

A – Quando o Sr. pegou foi em 1974, aí depois o Sr. Trabalhou um tempo no setor das valetas pra colocar as manilhas…

G – As manilhas de 4 bocas para passar os cabos subterrâneos.

A – Como é que funcionavam esses cabos?

G – De longe em longe tinha um poço, aonde ia uma tampa de ferro em cima. Aquilo é uma câmara escondida para passar os cabos subterrâneos.  Daquele local até a outra quadra,  mais ou menos,  passava subterrâneo,  abrir a tampa pra passar o cabo.  Depois abria as tampas e depois era emendado ali. 

A – E se arrebentasse algum fio lá dentro, como é que era?

G – Não arrebentava porque era bem protegido.

A – Devia ser um trabalho duro ali?

G – Não era muito fácil não. Tinha que abrir tudo, socar bem, deixar bem firme. Onde tinha  calçamento, tinha que fazer calçamento de novo, bem socado. E o calceteiro fazia o calçamento.

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Depoimento de Gilmar Rocha de Leon (G) em 2003.
Entrou para a CTMR em 1974 e começou a trabalhar no setor encarregado das valetas.
Entrevistador: André Luís Borges Lopes (A).
Fotografia de 1961.

A – Como era o trabalho na colônia? 

O – É difícil, com esses arames. Dava muito problema com poste. As forneirinhas (João de barro) faziam ninho e aquilo tinha que tirar, não podia deixar porque aquilo era terra, praticamente toda a semana tinha que tirar, saia a casinha e os passarinhos tinham que abandonar o ninho. A gente limpava e cortava as árvores que pegavam na rede, porque não podia pegar nada, senão dava problema na rede. Então tinha que tentar conservar tudo limpinho. Cuidar os arames, porque também roubavam muito arame. 

[…]

O – Os ladrões roubavam para vender.

A – Para fazer dinheiro? Tinha cobre?

O – Tinha cobre também. Essas linhas que iam para o Artur Lange, agora Turuçu, toda rede era de cobre, arame grosso, arame e bronze, […] e parece que não sei se eram 6 ou 8 arames, daquelas linhas, de primeiro, que eram da CRT quando tinha linha para Porto Alegre, eram com arame, depois a CRT botou outra rede e passou para CTMR, mas então quando descobriram que era cobre, levavam aos montes, levavam quarteirões.

A – Como é que descobriram?

O – A gente ia ver o defeito e chegava lá e estavam com os bigodes pendurados. Às vezes passava os sábados, os domingos, feriados com chuva, caindo raio. Tinha que estar lá para botar aquelas linhas no ar, porque não podia ficar sem telefone, nessa região não era costume ficar sem telefone.

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Depoimento de Oswaldo Azevedo da Silva (O) em 2003.
Trabalhou na CTMR de 1956 a 1963 e, depois, um outro período até 1992.
Entrevistador:  André Luís Borges Lopes (A).
Fotografia sem data.

R – Em 1957. Entrei como funcionário de qualquer tipo de serviço grosseiro, como trabalhar em valetas primeiro, fazer tubulação para os cabos, colocar cabos, essas coisas assim. Depois o patrão, falecido Manoel Gomes, foi que me tirou de lá para instalação, consertar telefone, porque antigamente tudo era com fio de cobre, com cruzetas, postes dentro da central. Depois que foram trocados esses postes de iluminação nova na rua, a empresa teve que tirar a nossa seção e aquilo era tudo com cruzetas, cheio de fios. Dentro da cidade era arame, ia daqui até lá fora […], no Artur Lange, mas aí eles retiraram aquilo tudo e colocaram cabos subterrâneos, tudo pelo chão, porque a maior parte dos cabos grossos vai tudo subterrâneo e em cada parte vai uma distribuição para poder ligar nas casas. Então tinham caixas para 10 telefones, 20 telefones para puxar os ramais para as casas, e esse era meu serviço: puxar um ramal para minha casa, para sua casa, e fazer instalação dentro de casa. A CTMR era eficiente no serviço, era a número 1. Hoje não se vê mais isso, não se faz mais isso, acabou-se o que era bom. A senhora não se incomodava em comprar o aparelho, a companhia lhe dava o aparelho, lhe dava o conserto. Quando o microfone estragava, o fone ou o cordão espiral estragava, a companhia ia lá e trocava gratuitamente. Nós tínhamos lista telefônica. Hoje já faz três anos que não tem mais. Por isso eu digo, para bem de melhorar está atrasando, eu lamento muito que a Brasil Telecom não está acompanhando o mesmo serviço que a CTMR fazia, é uma pena porque quando eu entrei…

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Depoimento de Rui Dorow (R) em 2003.
Entrou para a CTMR em 1957.
Entrevistadora: Maria Letícia Ferreira (M).
Fotografia sem data.

O – […] Entrei cavando de picareta. Naquele tempo abriam aquelas valetas, era de picareta. Hoje não, porque existem as escavadeiras, dava muito trabalho, nem existe picareta mais, mas iniciei cavando, abrindo valeta.

A – E o senhor começou cavando as valetas para…

O – Para colocar os cabos subterrâneos, cabos grossos, cabos primários que chamam, cabos que não poderiam ser aéreos, tinham que ser subterrâneos. Tinham cabos primários, depois os secundários que iam em cima nos postes, cabo “L”, então ia por cima e os cabos grossos todos subterrâneos. Abria as valetas para poder correr os cabos e enterrava aquelas manilhas que tem, sem cimento. […] A gente fazia de tudo só não ganhava muito dinheiro.

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Depoimento de Oswaldo Azevedo da Silva (O) em 2003
Trabalhou na CTMR de 1956 a 1963 e, depois, um outro período até 1992.
Entrevistador:  André Luís Borges Lopes (A).
Fotografia das obras de lançamento dos dutos de cerâmica na esquina da rua Almirante Tamandaré, em 1961.

LL – Quantos funcionários, mais ou menos, trabalhavam ali?

EC – Ali [no prédio da rua XV de Novembro] não sei, mas em toda a CTMR tiveram 440 funcionários no tempo auge. Ali eu não sei não, é que a CTMR não tinha muita gente na administração não, era uma empresa enxuta, não sei se tinha 80, 100 funcionários ali naquele prédio grande, não sei se tinha isso aí não, acho que não.

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Depoimento de Edson Cunha (EC) em 2005.
Começou a trabalhar na CTMR em torno de 1970.
Entrevistador: Luiz Leonardo Langlois Spallone (LL).
Fotografia sem data.

M – A central veio substituir o quê?

P – Veio substituir aquelas linhas manuais, aqueles telefones manuais que tinham uma manivelinha, que tinha que ligar para a telefonista, e dizer: “quero número tal”, isso se chama central manual; a própria telefonista que faz a conexão com o assinante; quando a pessoa tira o telefone do gancho, ela dá um sinal visual, ela entra lá fala com a pessoa, “olha, quero o número tal”, ela conecta … isso é uma central manual, e a central AGF veio para substituir esse tipo de serviço, para ser automatizado, a pessoa tira o telefone do gancho, recebe o sinal, ela mesma disca…

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Depoimento de Pedro Suder (P) e de José Luiz Santos da Silva (J) em 2004.
Começaram a trabalhar na CTMR na década de 1970 e ficaram até a venda para a Brasil Telecom.
Entrevistadoras: Maria Letícia Ferreira (M) e Heleonora Maria Lopes Rosa (H).

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LL – E como era o funcionamento de uma central mais antiga?

EC – Era uma eletromecânica. Elas eram com relés, com … tudo à base de relés de… essa central antiga mesmo, essa AGF era um relé que tem lá na escola ainda [atual IFSUL], era um buscador, quando tu tiravas o telefone do gancho e começava a discar, ele se posicionava na horizontal e depois se posicionava na vertical e… qualquer defeitinho mecânico era um horror, tinha muita mecânica, eletromecânica, e depois passou a ser tudo digital.

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Depoimento de Edson Cunha (EC) em 2005.
Começou a trabalhar na CTMR em torno de 1970.
Entrevistador: Luiz Leonardo Langlois Spallone (LL).
Fotografia da década de 1950 – início do funcionamento da primeira Central AGF.

J – Para mim foi o seguinte, para eu conhecer o material, chegou um equipamento da Suécia, e ele me disse: “Queres abrir as caixas?” e eu respondi: “Eu quero”.

M – Ele quem?

J – O presidente da empresa, Sr. Manoel, e eu cada vez que abria uma caixa, eu lia o quê que era, então toda vez que abriam uma caixa eu sabia o que estavam fazendo. Aí ele me mandou pra lá, ele não queria saber se eu sabia soldar, o quê que eu sabia, ela só cobrava: “Olha, tu vais soldar aqueles cabos”, e eu subi em cima da escada e olhei para o que o outro estava fazendo lá na outra ponta: “Eu quero fazer igual aquele lá”, fui fazer, ele foi lá, olhou, “está tudo bem”, aí era eu que tinha que soldar. Teve uma época que quem soldava os múltiplos era o Fonseca e eu, ele não aceitava que ninguém soldasse os múltiplos. O Pedrinho era outra parte. A gente aprendeu mesmo foi fazendo a montagem da central, melhor coisa que tem…

P – Todo equipamento a gente sabe que tem que seguir os esquemas, cada fiozinho tem o seu lugar, e é um monte de fio, então aí é que a gente aprende!

M – Essa central veio da Suécia?

P – Todo equipamento veio da Suécia, e nós montamos… parte dela…

J – Parte dela, a primeira montagem foi feita pelos próprios suecos que vieram aí, a Ericsson que veio montar, 2.000 linhas foram montadas por nós mesmos …

P – Mais que 2.000 linhas, nós montamos umas 5.000 linhas, quando eu entrei lá tinham 6.000 linhas.

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Depoimento de Pedro Suder (P) e de José Luiz Santos da Silva (J) em 2004.
Começaram a trabalhar na CTMR na década de 1970 e ficaram até a venda para a Brasil Telecom.
Entrevistadoras: Maria Letícia Ferreira (M) e Heleonora Maria Lopes Rosa (H).
Fotografia da década de 1950 – trabalhos na primeira Central AGF.

Ficha Técnica
Coordenação: Annelise Montone.
Curadoria: Annelise Montone, Noris Mara P. M. Leal, Clarissa Neutzling e Carina Ferreira.
Criação de arte e design: Clarissa Neutzling e Carina Ferreira.
Montagem: Noris Leal, Annelise Montone, Carina Ferreira, Clarissa Neutzling, Ana Carolina F. da Silva, Cláudia Abraão dos Santos Celente.